terça-feira, 18 de julho de 2017
CENTENÁRIO da obra de crítica e hodierna, de Lima Barreto, “OS BRUZUNDANGAS" - POR NÁDYA GURGEL
A ACADEMIA CEARENSE DE LETRAS (ACL), a ASSOCIAÇÃO DE JORNALISTAS E
ESCRITORAS DO BRASIL (AJEB-CE) têm a HONRA de apresentar a PALESTRA: CENTENÁRIO da obra de crítica e hodierna,
de Lima Barreto, “OS BRUZUNDANGAS” pela AJEBIANA e PROFESSORA DO IFCE-Campus
Ubajara, Nádya Gurgel.
I- Breve curriculum da AJEBIANA PALESTRANTE
nesta aprazível manhã de 20 de junho de 2017:
Nádya Brito Gurgel
Correia Dutra nasceu em Fortaleza, há quarenta anos, precisamente no dia 16 de
março de 1977. Seus pais, Raimundo Luciano do Amaral Gurgel (in memoriam) e Mária Brito Gurgel, foram
os maiores responsáveis pela sua incursão nas Artes. De seu genitor, herdara o
apreço por Música Clássica, História e Política, e de sua genitora, a extrema
afeição por CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS. Seus primeiros textos vieram sob forma de
HQ´s (Histórias em Quadrinhos), e consecutivamente a esta tipologia textual...
vieram os romances! E todos estes prenúncios de obras são hoje relíquias
guardadas a sete chaves pela autora. Com hercúlea dificuldade, em 1998 Nádya
Gurgel publicara seu primeiro romance (dos tantos em prelo), intitulado UM
NOVO AMANHÃ, prefaciado pelo excelso Acadêmico (ACL) Batista de Lima, e
que recebera crítica literária (via Correios) do grandioso Acadêmico (ACL) e jurista
Dimas Macedo; reiterado incentivo da saudosa e célebre autora Rachel de Queiroz
(ABL e ACL), do Acadêmico (ACL) Cid Sabóia de Carvalho, da nossa Acadêmica
(ACL) Giselda Medeiros (Presidente de Honra da AJEB) e do eterno Patrono desta diletíssima
mais antiga Academia de Letras do País (Fundada no dia 15 de Agosto de 1894), Artur Eduardo Benevides (in memoriam), e hoje presidida pelo
célebre Presidente José Augusto Bezerra! A supracitada autora é AJEBIANA desde
1999; professora Especialista em Ensino de Literatura Brasileira do Instituto
Federal do Ceará (IFCE), nos Campi de
Ubajara (Cursos de Licenciatura em QUÍMICA; AGROINDÚSTRIA; TÉCNICO EM ALIMENTOS
e GASTRONOMIA) e Baturité (Curso de LETRAS). Fora professora de importantes
Colégios e Cursinhos preparatórios para os mais difíceis vestibulares do país
(por quase dezessete anos), como: Colégio Sete de Setembro, M@ster, Ari de Sá
Cavalcante, Antares, Tiradentes e Irmã Maria Montenegro. É mãe do casal Nícolas
(10) e Isadora (06), esposa do Subtenente do 23º Batalhão de Caçadores
Cristiano Dutra. É partícipe de relevantes Antologias, em contribuição nas
categorias CONTO, ENSAIO e POEMAS, como na majestosa POLICROMIAS, da nossa
Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil, e de outras, como os títulos
esgotados CEIA MAIOR; ESPUTO e AMOR, MÚSICA E POESIA. Foi organizadora, revisora e prefaciadora da
obra poética e memorialística do ex-fazendário João Batista Terceiro (in memoriam) PASSADOS INESQUECÍVEIS. É desenhista por diletantismo, e professora
atuante de videoaulas de grande capilaridade entre os pré-universitários de
todo o Brasil.
II- Agora... o que não se pode deixar de saber
acerca da BIOGRAFIA de AFONSO HENRIQUES DE LIMA BARRETO (que tantos
influxos exercera em sua BIBLIOGRAFIA):
Um dos ícones do Pré-Modernismo (1902-1922),
Lima Barreto nascera na cidade do Rio de Janeiro, no dia 13 de maio de 1881, e falecera na mesma Terra
Natalícia, no dia primeiro de novembro de 1922, à Rua Major
Mascarenhas, no. 26, às 17 horas (Gripe torácica e colapso cardíaco). Anos
extremamente relevantes (1881 e 1922), também, para a historiografia literária
brasileira, a citar o surgimento do Realismo e do Modernismo, respectivamente.
Filho de Joaquim Henriques de Lima Barreto e Amália Augusta, ambos mestiços e
pobres, nosso Lima Barreto sofrera preconceito racial durante a vida inteira.
Seu pai era tipógrafo e sua mãe, professora primária, e falecera quando Barreto
tinha sete anos. Ano este em que pensara, pela primeira vez, em suicídio.
Sempre
auxiliado pelo padrinho abastado, Visconde de Ouro Preto, Barreto estudara no
Liceu Popular Niteroiense e concluíra o curso secundário no Colégio Pedro II, local
onde estudava a elite literária da época. E, devido à inegável dedicação aos
estudos, conseguira ingressar na Escola Politécnica do Rio de Janeiro (exame
vestibular), no tão almejado curso de Engenharia, em 28 de janeiro de 1897. Em
1904, foi obrigado a abandonar o curso, pois seu pai havia enlouquecido e o
sustento dos três irmãos agora era responsabilidade dele... Além de imensas
frustrações e dissabores enfrentados por ser o único mulato da sala e, assim,
não ter sido beneficiado (como os demais: brancos e abastados!) quando, por
exemplo, tinha dúvidas em Cálculo...
Provavelmente a sua
primeira grande frustração fora não ter se tornado Doutor- e isto passaria a
ser amplamente denunciado em suas obras: o culto exacerbado que no Brasil nutria
pelo título de Doutor, ou ao DOUTORISMO! Comumente Barreto externava que, no
Brasil de seu tempo, três pedras de anéis de formaturas eram as mais exaltadas:
safira (Engenharia), rubi (Direito) e esmeralda (Medicina). Esta convicção
barretiana é obsoleta ou ainda hodierna?
Outras experimentações
vitais infelizes nortearão sua escritura ácida e intrépida, como o fato de não
ter conseguido pertencer ao quadro excelso da Academia Brasileira de Letras,
fundada por Machado de Assis, Olavo Bilac, Alberto de Oliveira e outros ícones da
Bélle Epoque (nos idos de novembro de
1996... e com sessão inaugural em 20 de julho de 1897). Foram duas negativas ao
seu nome para imortal da ABL. Na terceira, ele mesmo retirara sua candidatura,
temendo nova decepção.
Fora colaborador de jornais de estudantes,
como A Lanterna, e depois faria uma
série de reportagens para o respeitado Correio
da Manhã, sem assinatura, sob o título “Os Subterrâneos do Morro do
Castelo”. Fora colaborador no jornal humorístico Tagarela, sob o pseudônimo de Rui de Pina. Trabalhara na célebre
revista Fon-Fon e publicara em
folhetins, no jornal A Noite, sua
obra Numa e Ninfa (que surgiria sob
forma de livro também 1917) e fora colaborador de muitos outros jornais e
revistas cariocas, como a A.B.C., da
qual se afastara após ter sido publicado nesta revista, por outro escritor, um
artigo contra a raça negra.
Em 09 de julho de 1903 fora classificado em
segundo lugar no concurso para a Secretaria da Guerra. Em 28 de outubro, tomara
posse do cargo. Isto significaria, de uma vez por todas, findar seu sonho de
estudar na Politécnica e passaria a experimentar reiteradas frustrações com o
trabalho repetitório e burocrático (que lhe daria muita inspiração para as
críticas externadas em romances como “TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA”, “CLARA
D0S ANJOS”, “OS BRUZUNGAS”, “VIDA E
MORTE DE M. J. GONZAGA DE SÁ”). Seria amanuense até 26 de dezembro de 1918.
Resultado: seu tempo líquido de serviço fora de 14 anos, 3 meses e 12 dias,
quando se aposentara, após algumas licenças para tratamento de saúde e seu
PRIMEIRO TERRÍVEL CONFINAMENTO EM HOSPÍCIO, de 18 de agosto de 1914 a 13 de
outubro.
O segundo confinamento
em hospício fora em 25 de dezembro de 1919 a 02 de fevereiro de 1920.
O
porquê dos internamentos? Alcoolismo; o fato de ter sido o único filho a cuidar
dos problemas mentais do pai e, assim, muito os absorvera...
A tão celebrizada e inolvidável obra
barretiana “TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA”, romance quixotesco brasileiro, surgira
em 26 de fevereiro de 1916, entre estes dois “tratamentos psiquiátricos”. E o
maior legado destes seus tempos tão sofridos no “Hospital Nacional de Alienados
no Rio de Janeiro” fora a obra intrigante e impactante “CEMITÉRO DOS VIVOS”.
Um alento Barreto recebera da Academia
Brasileira de Letras antes de partir: a menção honrosa (em janeiro de 1921) ao
romance “VIDA E MORTE DE M. J. GONZAGA DE SÁ”.
Lima fora, enfim, um
homem que nascera e crescera para ser um gênio, um crítico ferrenho da
sociedade burguesa finissecular oitocentista e daquele introito novecentista em
nosso País. Fora o “Boca do Inferno do Pré-Modernismo”!!??
Creio que sim, e
verticalizando ainda mais as temáticas críticas e contundentes abordadas pelo
bardo baiano Gregório de Mattos Guerra ao Brasil e seus Governantes no Séc.
XVII, ao tempo do Barroco.
Barreto, em todas as
obras produzidas, preferira a denúncia do arrivismo dos Políticos, eivados de
propinas e ausência de vistas sociais; quisera minorizar a dor dos mulatos e
lutar por um país com menos iniquidade e injustiça social. Nada mais premente,
imprescindível e hodierno. Muito obrigada, excelso escritor, que preferira a
criticidade (e por ela fora severamente castigado!) e não o lisonjeio gratuito.
III- E QUANTO À OBRA CENTENÁRIA “OS
BRUZUNDANGAS”?
Em junho de 1917, quando
Lima Barreto estivera enfermiço e recolhido no Hospital Central do Exército, ele
entregara ao seu editor Jacinto Ribeiro dos Santos os originais de OS
BRUZUNDANGAS, que apareciam em volume somente em dezembro de 1922, um
mês após seu falecimento.
Segundo um dos maiores
críticos literários que há acerca de Lima Barreto, H. Pereira da Silva, em sua
obra “LIMA BARRETO- ESCRITOR MALDITO”, “Na república da Bruzundanga, neste
livro que ferve, cozinha questões nacionais, se nada mais houvesse para
ressaltar, bastariam a sinceridade, a firmeza de caráter em dizer o que nos
diz, porque mexer no angu é menos prudente que derramar o caldo. Lima Barreto,
porém, prefere engrossar o caldo. Mete a colher no angu, encaroça-o, salga-o,
apimenta-o, mas dá-lhe certo sabor, certos requintes de humor desconhecido dos
historiadores afeitos a insossos pratos servidos na Bruzundanga das letras.”
(2ª. Edição, Editora Civilização Brasileira, pág. 114)
Desde o título, desde o
léxico escolhido, BRUZUNDANGA, em alegoria ao Brasil, podemos perceber seu
intento de nos levar a refletir acerca de uma possível desordem, algavaria,
mixórdia, BAGUNÇA... que nos possa rodear (e como, claro, poderíamos solucionar
tal precariedade estrutural social)!
Na República da
Bruzundanga, reiteradas são as críticas aos cargos públicos ocupados por
bajuladores e néscios; aos poetas “Samoiedas” (em nítida crítica negativa à
impassibilidade da poética parnasiana, que assim ele a julgava!); aos Doutores
tão exaltados e, segundo ele, hipócritas; aos escritores ou aos oradores usuários
de um discurso exacerbadamente esmerado e hermético, em desarmonia com a
realidade da maioria dos brasileiros. Sem faltar críticas ao teatro, à
religião, à música, às eleições, ao RACISMO...
Alguns excertos para análise verticalizada de
“OS BRUZUNDANGAS”:
I-SOBRE OS LITERATOS
“- Quantas cartas tens aí!-
disse-lhe eu ao vê-lo abrir a carteira, para tirar uma nota com que pagasse a despesa.
- São “pistolões”.
- Pra tanta gente?
- Sim; para os
críticos dos jornais e das revistas. Não sabes que vou publicar um livro?”
(BARRETO,
Lima. Os Bruzundangas, pág.140)
II- NO GABINETE DO MINISTRO
“- O senhor quer ser diretor do Serviço Geológico da Bruzundanga?-
Perguntou o ministro.
- Quero,
excelência.
- Onde estudou
geologia?
- Nunca estudei,
mas sei o que é vulcão.
- Que é?
- Chama-se vulcão
a montanha que, de uma abertura, em geral no cimo, jorra turbilhões de fogo e
substâncias em fusão.
- Bem. O senhor
será nomeado.
***
Pâncome, quando se deu uma vaga de amanuense na sua Secretaria de
Estado, de acordo com o seu critério não abriu concurso, como era de lei, e
esperou o acaso para preenchê-la convenientemente.
Houve um rapaz
que, julgando que o poderoso Visconde queria um amanuense chic e lindo, supondo-se ser tudo isso, requereu o lugar, juntando
os seus retratos, tanto de perfil como de frente. Pancôme fê-lo vir à sua
presença. Olhou o rapaz e disse:
- Sabe sorrir?
- Sei,
Excelentíssimo Senhor Ministro.
- Então mostre.
Pancôme ficou contente e indagou ainda:
- Sabe
cumprimentar?
- Sei, Senhor
Visconde.
- Então,
cumprimente ali o Major Marmeleiro.
Este major era o
seu secretário e estava sentado, em outra mesa, ao lado da do ministro, todo
ele embrulhado em uma vasta sobrecasaca.
O rapaz não se
fez de rogado e cumprimentou o major com todos os “ff” e “rr” diplomáticos.
O visconde ficou
contente e perguntou ainda:
- Sabe dançar?
- Sei,
Excelentíssimo Senhor Visconde.
- Dance.
- Sem música?
O visconde não se
atrapalhou. Determinou ao secretário:
- Marmeleiro,
ensaia aí uma valsa.
- Só sei Morrer sonhando (exemplo).
- Serve.
O candidato
dançou às mil maravilhas e o visconde não escondia o grande contentamento de
que sua alma exuberava.
Indagou afinal:
- Sabe escrever com desembaraço?
- Ainda não,
doutor.
- Não faz mal. O
essencial o senhor sabe. O resto o senhor aprenderá com os outros.
E foi nomeado,
para bem documentar, aos olhos dos estranhos, a beleza dos homens da
Bruzundanga.” (Idem, págs. 144 e 145)
III- A NOBREZA NA BRUZUNDANGA
“(...)
As moças ricas não
podem compreender o casamento senão com o doutor; e as pobres, quando alcançam
um matrimônio dessa natureza, enchem de orgulho a família toda, os colaterais,
e os afins. Não é raro ouvir alguém dizer com todo o orgulho:
- Minha prima está
casada com o doutor Bacabau.
Ele se julga também
um pouco doutor. (...)
A formatura é
dispendiosa e demorada, de modo que os pobres, inteiramente pobres, isto é, sem
fortuna e relações, poucas vezes podem alcançá-la.
Coisa curiosa! O que
mete medo aos candidatos à nobreza doutoral não são os exames da escola
superior; são os exames preliminares, aqueles das matrículas que constituem o
nosso curso secundário...
Em geral, apesar de
serem lentos e demorados, os cursos são medíocres e não constituem para os
aspirantes senão uma vigília de armas para serem armados cavaleiros.
O título – doutor -
anteposto ao nome, tem na Bruzundanga o efeito do – dom – em terras de Espanha.
Mesmo no Exército, ele soa em todo o seu prestígio nobiliárquico. (...)
(...)
O nobre doutor tem
prisão especial, mesmo se tratando dos mais repugnantes crimes. Ele não pode
ser preso como qualquer do povo. Os regulamentos rezam isto, apesar da
Constituição, etc., etc.
Tendo crescido
imensamente o número de doutores, eles, os seus pais, sogros, etc., trataram de
reservar o maior número de lugares do Estado para eles. Capciosamente, os
regulamentos da Bruzundanga vão conseguindo esse desideratum.
(...)” (Ibidem, pág. 33 e 34)
IV- AS ELEIÇÕES
“(...)
Julgavam os chefes e
capatazes políticos que apurar os votos dos seus concidadãos era anarquizar a
instituição e provocar um trabalho infernal na apuração, porquanto cada qual
votaria em um nome, visto que, em geral, os eleitores têm a tendência de votar
em conhecidos ou amigos. Cada cabeça, cada sentença; e, para obviar os
inconvenientes de semelhante fato, os mesários da Bruzundanga lavraram as atas
conforme entendiam e davam votações aos candidatos, conforme queriam.
(...)” (Pág. 92)
FOTOS
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário