sexta-feira, 12 de abril de 2013
CARTA À MINHA CIDADE, COMPLETANDO NESTE SÁBADO, DIA 13/4, 287 ANOS - NILZE COSTA E SILVA
Fortaleza, minha
cidade amada.
Não sei como nem porque este rio da minha vida veio desaguar
por estas terras. Sei que tinha pouquíssimo tempo de vida e não sabia um
tantinho assim do que fosse ser alguém no mundo. Meu espaço era tão
pequenininho! Compunha-se de uma rua, que parecia enorme, uma casa grande de
altas paredes e um quintal repleto de bananeiras e castanholeiras. Depois esse
mundo foi crescendo, se expandindo, saía pelo quintal que ia dar na Rua José
Avelino, subia até o Quartel General, passava pelo Passeio Público e Praça da
Estação. Se subisse à esquerda, no 1º quarteirão, seguia pela ladeira que se
encontrava com a Rua Monsenhor Tabosa e desembocava na Igreja da Prainha e
Seminário Velho, onde se ordenaram ilustres párocos, como Padre Cícero e
Monsenhor Tabosa.
Se resolvesse ir pela
ladeira seguinte, entrava na Biblioteca Pública, uma casa antiga situada em
frente à Praça do Cristo Redentor, onde a minha adolescência ia percorrer os
livros envelhecidos que eu olhava, folheava e lia com zelo e admiração.
Fui crescendo e conhecendo
essa Cidade Mulher, que um dia ouvi chamarem de “loura desposada do sol”.
Meu primeiro contato com Fortaleza foi com o seu lado mais
antigo: Praia de Iracema, Alfândega e Arraial Moura Brasil - zona de
meretrício, cujo nome nem se podia citar, na época. Foi por ali que se iniciou
o comércio da cidade, indo ao Passeio Público, Praça da Estação e afastando-se
cada vez mais do mar.
Sendo um ser de beira de praia, senti-me arrastada para
outros lados da cidade, Bezerra de Meneses, Parque Araxá, Parquelândia, Barra
do Ceará, Bairro Ellery, Dionísio Torres e Bairro Edson Queiroz, onde fico até
hoje.
Em criança, tinha que
me deixar levar pela vontade dos adultos. A brusca mudança e o mundo daquela
gente grande me assustaram. A cidade exaltava-se, alvoroçava-se, enchia-se de
pessoas estranhas que já não faziam parte da minha infância rodeada de mar.
Na adolescência,
angustiei-me ao perceber que a cidade inchava daquela gente expulsa do sertão
pela seca e desigualdades fundiárias. Viadutos, bairros periféricos e terrenos
baldios eram invadidos.
A minha Fortaleza mudou-se comigo da Praia de Iracema para
um outro cenário. Via-me estranha, como se numa outra cidade, maquiando-se,
afastando-se, não mais se penteando na orla como uma “loura desposada do sol”.
Você crescia, Fortaleza, com sua dupla personalidade. De um
lado ardente, ousada e bela. De outro, deslavada, desvalida, triste e pobre em
sua periferia.
- Do livro Fortaleza Encantada (Livraria
Cultura)
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